Poesia Dissolvida

late-stage-1431760__340
Imagem: http://www.pixabay.com

Caminho lentamente

Por esta casa,

Estas quatro paredes

Caminho lentamente

Conto os passos que ficaram

Me trouxeram aqui

Vejo como se desvanecem

No passado

Que já não sou

Já não quero

Não escrevo mais.

Deito-me no silêncio

O cansaço apodera-se

Calo os ecos, os gritos

As lágrimas.

As lágrimas voltam.

Às vezes voltam.

O chão está frio

E pergunta-me do presente

Que presente é este?

Escapo à realidade

Mas volto sempre

Finjo-me

Apenas.

Por momentos. Finjo-me.

Podia ser.

Mas agora estou aqui.

Não posso fingir sempre.

Também tem que doer.

O chão está frio

Mas é Aqui.

É Agora.

Sou. Sinto. Estou.

Levanto-me.

Caminho lentamente.

Para lá da porta que abri.

Caminho.

© Isa Lisboa

Solitude

Solitude

Palavra estranha

A alguns desconhecida

É aqui junto ao mar

Que melhor a saboreio

Deixo-a pousar

Na palma da minha mão

O vento levanta-a

E ela rodeia-me

No abraço de quem

Me conhece

Descansa em mim

E eu descanso nela

Como duas velhas amigas

A ouvir o mar.

© Isa Lisboa

 bench-439073__180 p

Publicado originalmente no blog Tubo de Ensaio:

http://tubodeensaio-laboratorio.blogspot.pt/2015/01/solitude.html

Safira

 

Kawica Singson, Lava and water on camera

Foto: Kawica Singson

Lúcio observa a estranha mulher que, descalça e de calças arregaçadas se aproxima da água. Estava ali parada, apenas parada. Parece enterrar os pés na areia molhada, um de cada vez.

Antes de descer, percorreu o rochedo que ali se ergue, parando de tempos a tempos e também ali permanecendo imóvel por uns tempos. Parecia procurar alguma coisa, mas nada havia ali para achar. À frente, só o mar e, ocasionalmente, um pequeno barco à vela.

Move-se, segue em frente. Acaba por voltar atrás, talvez surpreendida pela onda mais forte que agora veio. Imóvel, continua imóvel, apenas olhando agora para a água, em baixo.

 

Safira olha a água do mar a ir e vir e a forma como os grãos de areia deslizam lentamente ao seu sabor. Nunca antes tinha reparado: parecem grãos de ouro a desfazerem-se e refazerem-se na água.

 

© Isa Lisboa

Publicado originalmente no blog Tubo de Ensaio