Acender uma vela na escuridão

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Em tempos que falta a luz, resta-nos acender uma vela, para cortar um pouco da escuridão.  Para nos permitir ver que ainda há um caminho, mesmo que não seja tempo de caminhar.

Acender uma vela em nós mesmos pode revelar-se a tarefa mais difícil que encontramos. Mas só assim saberemos o tamanho da escuridão.

E a escuridão dá medo, lembrando quando éramos crianças e os monstros se escondiam, à noite, nos cantos mais escuros da casa.

Crescemos, e a escuridão passa para aqueles momentos da vida em que tudo parece impossível, irreal e surreal.

Mas na verdade, a escuridão é a perda da esperança e a perda da fé em nós mesmos.

E a escuridão é também a cegueira de não querermos olhar para nós mesmos e ver. Ver os passos que demos e nos levaram ali. Ou os passos que não demos agora para sair.

Porque é preciso muito mais coragem para aceitarmos a nossa quota-parte no nosso destino, do que o é para amaldiçoarmos a escuridão.

Aquele canto escuro, onde nos escondemos, enrolados sobre nós próprios, com pena de nós mesmos… Esse canto, é a verdadeira escuridão, a que escondemos dentro de nós.

E se nos apegarmos demasiado a esse canto, facilmente nos esquecemos de que a escuridão não existe sem a luz: antíteses complementares que se completam.

Basta um passo, basta lembrar, acreditar. Acreditar na luz que nunca se extingue. Mas também acreditar na escuridão que sempre a acompanha.

E, sobretudo, acreditar, lembrar, assumir, que a escolha entre uma e outra, é sempre e só, apenas tua. Em cada momento, em todos os momentos. Não escolhes só uma vez, porque a vida está sempre a pôr-te à prova.

A vida põe-te à prova para que possas reclamar um prémio: a tua essência, o teu ser mais puro, quem tu és. A vida põe-te à prova para que te descubras. E para que quando te encontres te possas reinventar. Hoje, amanhã, quando for.

O que vais escolher, agora?

© Isa Lisboa

Árvores, ervas e tempestades

Esta semana recordaram-me a palavra “resiliência”.

Resiliência é diferente de Resistência. Embora nalgumas circunstâncias, seja necessário apelarmos à nossa capacidade de resistência, na maioria das vezes é a resiliência quem nos pode ajudar a chegar ao final do dia, uma dia de cada vez.

Foneticamente, a diferença entre estas duas palavras é subtil.

Na prática, é-o menos; mas, por outro lado, é uma diferença nem sempre fácil de entender. Gosto da analogia das árvores e das ervas para perceber esta diferença.

É uma analogia que li em artigos relacionados com a filosofia oriental.

Ela fala das árvores, de como são robustas, com os seus fortes e largos troncos. Por oposição, as ervas possuem caules finos, menos fortes.

No entanto, perante uma forte tempestade de vento, as árvores podem acabar por ser arrancadas pela raiz ou até o seu tronco ser quebrado a meio. Por outro lado, ao acabar a tempestade, encontraremos as ervas curvadas em direcção ao chão, mas intactas. E, ao terminar a tempestade elas levantam-se lentamente.

É esta a diferença entre Resistência e Resiliência. As árvores mostram-nos a resistência e as ervas a resiliência.

As árvores, ao usarem toda a sua força e pujança para lutar contra o vento resistindo-lhes, acabam por se ir deixando desgastar pelas investidas do vento. E quando o vento ataca durante mais tempo do que aquele que elas conseguem aguentar, elas perecem.

Por outro lado, as ervas usam a flexibilidade do seu caule para se curvarem. Este verbo tem uma conotação negativa, mas neste caso vejo-o de outra forma. As ervas inclinam-se ao sabor do vento, aceitando a tempestade, sabendo que nada podem fazer contra ela, que o vento só parará de soprar quando assim o quiser. Ao aceitarem a adversidade, não gastam as suas energias numa luta que não poderiam ganhar – pois se até algumas das fortes árvores são ao chão! Ao curvarem-se, deixam que o vento passe por cima de si. Talvez o vento as magoe, ainda assim. Mas através da paciência e da sua capacidade de se manterem flexíveis (flexíveis, não moles), elas conseguem sobreviver ao vento.

Também nas tempestades da vida precisamos escolher se somos árvores ou ervas. Se decidimos lutar, sem direcção, sem saber a força daquele inesperado inimigo. Se lutamos apenas porque sempre nos ensinaram a ficar de pé, firmes, fortalezas inexpugnáveis.

Ou se somos, naquele momento, ervas. Se nos agarramos a quem somos, à nossa força interior. Se usamos a nossa força interior para suportar as investidas do vento. Deixar que ele nos faça baixar, mas não que nos quebre. Sentir a dor do vento a tentar passar por nós, a magoar-nos a pele. Sentir a força do vento, mas agarrarmo-nos à nossa vontade. Lembrarmo-nos de que a tempestade não dura sempre. E que esta também não vai durar.

Sermos erva, protegendo o essencial de nós, sentarmo-nos a aprender a força do vento, a aprender a nossa própria força e a recuperá-la, a aumentá-la. Tocando o chão, sentindo não que caímos, mas que tocamos novamente no pó de que fomos feitos. Tocando o chão que nos dá a vida e sustenta. Resiliência.

Neste momento, é hora de seres árvore ou de seres erva?

© Isa Lisboa

Heavy Winter by Mikael Sundberg
Foto: Heavy winter, by Mikael Sundberg