[Resultante de um desafio de escrita]
Cheguei a casa e, assim que abri a porta, vi-o. A vasculhar-me o frigorífico, com uma grande descontração.
Já estava por tudo, fechei a porta, e sentei-me na cadeira a observá-lo. Disse-me algo naquele dialecto ininteligível. Arrisquei um “Olá” e ele pareceu entender.
Tinha o conteúdo do frigorífico espalhado na bancada e fazia calmamente uma sandes.
Que diz estranho este. Passei o dia todo a cruzar-me com homenzinhos e mulherzinhas cinzentas, de estatura curvada e sem expressão no rosto.
Tentei interagir, mas a reacção não foi muito calorosa.
Se era uma invasão extraterrestre, não estavam a ser muito ferozes. Era como se estivessem a incorporar-se lentamente no dia-a-dia, a tentar passar despercebidos.
E agora está um aqui em casa. Isto é tudo muito confuso. Talvez eu esteja a sonhar. Ou a delirar.
Comporta-se como o meu marido, mas não parece ele. Será que os ETzinhos sempre andaram por aí e agora apenas lhes caiu a máscara?
Agora fico assustada com a ideia. Estarei em perigo? Relativizei durante todo o dia, mas agora que penso que posso ter estado todo este tempo a viver com um ET… Isso é assustador!
O que é que isso quer dizer? O que pode implicar?
O possível ET acende a televisão, estão a dar notícias. Nada de anormal a ser anunciado. Não há uma invasão alienígena como notícia de abertura.
Mas o pior é que todas as pessoas na TV se parecem com ele. Com eles. Com os ET’s de hoje.
Começo a sentir-me tonta e vou até ao WC. Lavo a cara com água fria. Pode ser que me ajude a acordar.
Fico com as mãos cobertas de uma substância cinzenta. Fico ainda mais alarmada. Olho ao espelho e vejo a minha cara a derreter. Ou assim parece. É apenas uma espécie de pele cinzenta que se despeja, deixando antever uma cor e textura diferentes. Continuo a passar água até tudo sair.
Demoro algum tempo a digerir o que vejo. Mas de repente, tudo faz sentido.
Não são eles os ET’s.
© Isa Lisboa
