
Foto: Autor não identificado
Vivemos numa sociedade que não gosta de cicatrizes. Cicatrizes nas suas variadas formas. Físicas e emocionais.
É verdade que tanto umas como outras representam uma dor vivida, e talvez por isso nos seja tão difícil encarar essa marca – em nós e nos outros.
Mas também é verdade que as nossas cicatrizes contêm a nossa história. E ainda que ela tenha sido dolorosa, faz parte de nós. Tudo o que nos acontece vem com o intuito de nos ensinar algo ou de nos fazer crescer e experienciar o potencial da vida. Aquilo que acredito ser o sentido da vida.
Por vezes estas cicatrizes são memórias que guardámos no sótão do nosso coração, memórias dolorosas. Não vale a pena remetê-las para um baú fechado no canto mais escuro desse sótão. As memórias não se calam nem se amordaçam. Devemos antes aceitá-las como parte de quem fomos. Deixando de fugir delas e de lhes resistir, poderemos entender o que elas nos ensinaram, e em que medida nos tornaram mais fortes. Aprendida a lição e, ultrapassado o obstáculo, estamos então prontos para o que vem a seguir.
Porque algo vem a seguir. Sempre.
Há alguns anos atrás, numa feira de rua, comprei um livro em segunda mão. Ao chegar a casa, quando ia arrumá-lo, um bilhete caiu. Tinha escrita à mão, uma simples frase: “Tudo ainda está para vir.” Sentia-me numa fase de recomeço de ciclo, tinha feito algumas mudanças na minha vida. Foi, para mim e naquele momento, uma mensagem de esperança e uma indicação de que estava no caminho certo.
E, agora que tudo muda de novo, sei que estava. Percorri o caminho que precisava percorrer, para entender em pleno as minhas cicatrizes e para poder afirmar que elas são apenas uma pequena parte da história; mas que a história que se escreverá daqui para a frente será pelo meu punho, com a minha caneta. Como deve sempre ser.
E tudo continua ainda por vir.
© Isa Lisboa